Em seis meses, o número
de mulheres mortas por violência doméstica já ultrapassou mais de metade dos
números de 2012.
ESQUECER A PRIMEIRA
AGRESSÃO É TÃO DIFÍCIL COMO ESQUECER O PRIMEIRO BEIJO, DIZ A CAMPANHA DA
ASSOCIAÇÃO MULHERES CONTRA A VIOLÊNCIA.
Perguntar a Maria
Macedo, diretora técnica da Associação de Mulheres Contra a Violência (AMCV),
quantas mulheres morreram este ano em Portugal vítimas de violência doméstica
implica receber uma resposta emocionada: "Uma mulher morta
que seja é sempre um número altíssimo".
Em 2012, as mortes
contabilizadas são, por isso, "demasiadas": 37,
segundo os dados da GNR e da PSP, que também registaram 26.084 queixas de
violência doméstica.
Este ano, os números
continuam a preocupar. Até junho, já se registaram pelo menos 20 assassínios e
21 tentativas de homicídio relacionados com violência doméstica, de acordo com
informações recolhidas pela União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR) e
fornecidas ao Expresso.
Números que podem ser
ainda mais graves do que parecem, uma vez que Maria Macedo revela que as
autoridades não contabilizam as mortes das vítimas que não falecem no dia e
local da agressão, assim como as mortes de pessoas relacionadas com a vítima de
violência. "Conheço um caso, no ano passado, de uma amiga de uma
mulher agredida que foi assassinada quando foi a casa do casal buscar alguns
pertences. Esse tipo de mortes não entra na contagem", diz.
Prisão 'não
domiciliária':
Maria Macedo explica
também o funcionamento de uma medida de coação a agressores que tem sido cada
vez mais utilizada: a pulseira eletrónica. Até 30 de junho deste ano, 149
arguidos estavam sujeitos a esta vigilância, mais do que os 116 registados nos
12 meses do ano passado, segundo dados da Direção-Geral da Reinserção e
Serviços Prisionais. "É uma medida de afastamento. Os agressores têm
uma pulseira que não podem retirar e as vítimas têm um dispositivo, do tamanho
de um telemóvel, que apita quando os agressores estão a menos de 'x' metros
delas. A pulseira também avisa o agressor que tem de se afastar e os sinais são
enviados para a Cruz Vermelha, que depois articula a situação com as
autoridades".
Prestes a completar 20
anos, a AMCV acompanhou, no ano passado, 9.135 pessoas em situações de
violência, numa média mensal de 192 utentes, nos seus centros de acolhimento,
casas de abrigo e grupos de ajuda. "De 1993 para cá a situação em Portugal
já é completamente diferente, é um tema que as pessoas reconhecem",
explica Maria Macedo. "Há 20 anos olhavam para nós como se
fossemos de Marte, até relativamente à igualdade sexual."
"As mulheres são
muitas vezes reféns e aguentam num sistema de sobrevivência, sem se mexerem
muito para evitarem mais agressões. O risco de morte é maior na altura em que
elas vão sair ou quando estão separadas, por isso é que elas têm de estar
informadas, para saberem qual a melhor forma de saírem em segurança",
explica, justificando a nova campanha da AMCV, intitulada "Esquecer
a primeira agressão é tão difícil como esquecer o primeiro beijo".
A AMCV pretende que haja
uma maior consciencialização sobre a violência doméstica, pelo que, para além
da campanha que irá ser divulgada nas televisões, associou-se ao Benfica para
realizar uma ação no jogo das "águias" frente ao Gil Vicente:
conseguir que trezentos casais se beijem ao mesmo tempo no Estádio da Luz, num
gesto contra a violência sexual.
"As pessoas já têm
outra forma de olhar, mas não deixa de ser difícil perceber as coisas e
intervir, até por parte das famílias, uma vez que o agressor cria estratégias
de isolamento. Às vezes não sabem o que podem fazer, as pessoas perguntam-nos
isso. Ainda há muitos mitos em relação à violência doméstica", conclui Maria Macedo.
Sem comentários:
Enviar um comentário